Cachorro 2.0


Jorge era uma pessoa excêntrica, e todos concordariam com isso. Todos também concordariam que Jorge era um brilhante engenheiro, capaz de criar as mais inventivas soluções sempre que surgia um problema. Ele tinha construído sua própria casa e seu próprio carro, ambos altamente tecnológicos. Pegar uma carona ou fazer uma visita ao Jorge era como entrar em uma máquina do tempo e dar um grande salto rumo ao futuro.

Sua casa tinha entrada com reconhecimento facial, com possibilidade de cadastrar a família e amigos. Tinha um sistema de autorrenovação e, bastava apertar um botão para que tudo estivesse limpo e arrumado, como novo. Aliás, o sistema de autoavaliação constante exibia em que parte da estrutura poderia haver algum problema para então, o sistema de auto manutenção solucionar tudo sem demora. E tudo isso, em uma construção altamente sustentável que funcionava com energias renováveis.

Claro que o carro do Jorge seguia seus mesmos princípios, era rápido, seguro e sustentável. Ele nunca aprendeu a dirigir porque achou que seria mais útil aprender a construir um piloto automático. Assim, Jorge sempre que quisesse poderia mandar seu carro buscar alguém em algum lugar. Ou até mesmo, ele próprio.

Em meio a tantos avanços tecnológicos e uma grande realização profissional, Jorge sentia falta de alguma coisa. Um dia, quando voltava da sua oficina de concertos eletrônicos, reparou que nas ruas sempre tinha alguém passeando com um cachorro. Era isso, ele precisava de companhia.

Bastou chegar em casa para ir ao seu laboratório subterrâneo. Claro que um engenheiro como ele não iria simplesmente adotar um cachorro. Um engenheiro precisa aperfeiçoar o que já existe de bom e, até os cachorros mais adoráveis exigem muito cuidado. Eles mijam na geladeira, cagam no tapete, comem os pés das mesas e ainda, precisam ser levados para passear e ao veterinário regularmente.

Não, o cachorro de Jorge seria diferente. Seria um cachorro 2.0, que não precisaria comer e nem fazer necessidades. Seria ensinado sem precisar de treino algum e, nunca faria nada de errado. Aquela invenção se tornaria com certeza uma revolução no mundo pet.

Depois de algumas semanas sem descanso, finalmente estava pronta a sua mais nova criação, que Jorge chamou de “Cachorrobô”. É, Jorge não tinha muito bom gosto para piadas, apesar disso, ainda era um gênio como engenheiro. E o Cachorrobô latia na hora e volume certos, brincava na hora certa, não dava o mínimo trabalho. Parecia a companhia ideal.

Passaram algumas semanas e, Jorge percebeu que um bichinho de estimação altamente previsível não era uma ideia tão boa assim. Foi quando ele decidiu fazer um teste e, mexeu na totalmente na programação. Incluiu algumas traquinagens naturais de cachorro e ativou uma personalidade aleatória para o Cachorrobô.

No dia seguinte, após um dia de trabalho, Jorge chegou em casa. E encontrou o Cachorrobô terminando de comer o seu sofá. Uma luz de alerta da casa piscava indicando que o sistema de auto manutenção não tinha a capacidade de resolver todos os estragos feitos naquele período de apenas oito horas. Jorge olhou para o Cachorrobô e sorriu. Nunca tinha estado tão feliz. Ali estava a sua obra prima.

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